Comemorando os 36 anos do primeiro jogo da franquia, uma nova versão foi lançada para o Nintendo Switch: Ghost’n Goblins Ressurection. Porém, fica uma dúvida bem forte: o perfil dos jogadores em geral mudou; não há mais tanto tempo ou até mesmo paciência necessária para conseguir passar das fases tão difíceis. Como a Capcom pode manter a essência da série, sem ignorar esse fato?
Desafiador na medida certa para cada jogador
Adicionar níveis de dificuldade foi uma das soluções encontradas pelos desenvolvedores. O primeiro nível, Page, faz com que o protagonista, Arthur, possa levar 3 danos antes de morrer, em vez de seu mísero 1 ponto já famoso pela história da série. Já as outras três dificuldades, Squire, Knight e Legend, trazem somente um ponto de vida, mas com intensidade diferentes de inimigos e projéteis na tela. Eu joguei o primeiro jogo da série, de NES, com ajuda de benefícios introduzidos pelo serviço de jogos retrô incluso na assinatura online do Switch, como save states (salvar o jogo em qualquer momento) e o rewind (voltar a fase para um momento anterior). Começar Ghost‘n Goblins Resurrection na dificuldade Legends foi um processo interessante, já que as facilidades que usei na primeira versão não estão presentes aqui. Foi uma tortura. Arthur tem controles péssimos, parecendo que sempre está debaixo d’água. Seus pulos têm um arco estranho, sua corrida é lenta e ele às vezes parece não obedecer aos controles, igual no jogo de NES. Isso não deveria ser algo agradável, mas faz parte do que torna Ghost n’ Goblins o jogo que ele é. Em algum momento o jogador se acostuma com a tortura, e se não acostumar sempre pode diminuir a dificuldade. Além disso, o jogo também conta com o Magic Metronome, uma espécie de controlador da velocidade do game que permite que o desafiante altere a velocidade que os inimigos se movimentam. É dando essas opções de acessibilidade e customização de dificuldade que o jogo quer atingir públicos diferentes e modernos, e, de verdade, funciona bem. Após cerca de 4 dias tentando na dificuldade mais alta, passei o jogo para a menor delas, e minha surpresa foi que ainda existiam desafios, mas de forma menos punitiva. Em uma comparação provavelmente muito errônea, mas funcional, diria que jogar nas dificuldades menores é um processo menos behaviorista. Behaviorismo é uma vertente filosófica da psicologia que analisa padrões de comportamento de uma determinada espécie num determinado ambiente. Um exemplo bem fácil para compreender isso é o adestramento de cães, já que cachorros são incentivados a ter um comportamento específico a partir de certos gatilhos, como um petisco. Jogos antigos, em especial se pensarmos da Capcom na era do NES ou do Super NES, sempre contavam com isso. Jogar um Mega Man dos clássicos significa decorar como se comportar nas fases para passar com o mínimo de dano possível. O primeiro Ghost n’ Goblins e todos os jogos subsequentes da franquia também tem isso, com todos os inimigos e projéteis tendo lugares fixos, e um erro da forma correta de se jogar pode custar uma importante tentativa. Jogar na menor dificuldade Ghost’n Goblins Resurrection dá mais espaço para erros, e talvez seja o jeito ideal de treinar para tentar dificuldades maiores, principalmente ao se acostumar com o personagem.
Pintura medieval
Ghost’n Goblins Resurrection conta com um visual que, enquanto traga à lembrança os antigos jogos da franquia, se torna algo bem mais artístico, puxando bastante para horror medieval. Embora obviamente seja um jogo onde os inimigos finais são demônios católicos, é somente nesse jogo que eles saem de um visual um tanto quanto anime para algo mais parecido com pinturas medievais, deixando uma impressão bem mais forte. Ghost’n Goblins Resurrection alcança essa linha artística usando a RE Engine, motor gráfico usado por lançamentos recentes da Capcom que são considerados exemplos de jogos lindos no PS4 e no Xbox One, como Monster Hunter World, Resident Evil VII e Resident Evil 3. A maior surpresa disso tudo é ver a otimização dessa engine no Nintendo Switch: GnG Resurrection roda de forma lisa, sem nenhuma queda de quadros, mesmo em momentos mais intensos. As fases vão construindo a narrativa de salvar a princesa de forma clássica, mas com um toque de horror impressionante. É o cemitério com túmulos escorrendo sangue, o deserto cheio de corpos desidratados, o estômago do demônio ou a fortaleza do chefe final, todas num tom certo de assustador e simpático que consegue gerar desconforto e diversão. O design de fases de Ghost’n Goblins Resurrection também brilha bastante, com o jogo fazendo sentido em cada conexão de áreas e checkpoint. Cair no trato digestivo de um demônio para lutar com um verme que está roubando a comida dele é incrível e desafiador, e faz todo sentido no mundo de aspecto sujo que fomos apresentados até então. Porém, mesmo com o design de fases excelente, o controle péssimo do jogador sobre Arthur complica algumas coisas. Como eu disse acima, isso faz parte da série, mas é inegável que em certos momentos é frustrante. Entender se isso é um ponto positivo ou negativo, no fim, vai depender de cada jogador. Para mim, ficam dúvidas, mas acredito que pensando na proposta geral do jogo, é positivo sim.
Um clássico para a visão moderna
Ghost n’ Goblins Resurrection é um jogo fantástico. Talvez não para todo mundo, mas com certeza tem um público que irá o considerar um dos grandes títulos do Nintendo Switch. Ele está disponível na Nintendo Eshop por 139 reais, acessível pelo console ou pelo navegador na versão internacional. O jogando por 8 horas, incluindo tentativas na dificuldade mais alta e duas jogadas na menor, para poder habilitar o final verdadeiro, o jogo me agradou e muito. E no fim, acho que principalmente para os saudosistas, Ghost’n Goblins Resurrection é uma excelente aquisição.